Vinil da Semana: 'In Utero' - Nirvana | Review


Vindo diretamente da ala grunge do podcast, o Paulo traz pra gente um clássico para o #VinildaSemana: o 'In Utero' do Nirvana!

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O que dizer do Nirvana? Possivelmente a banda mais celebrada dos anos 1990, peça principal de um dos movimentos mais característicos da música. Um dos maiores grupos da história da música e, mesmo com apenas 3 álbuns, causaram a explosão do rock alternativo. Seu principal álbum, Nevermind, é celebrado como um dos maiores álbuns de todos os tempos, com singles como "Smells Like Teen Spirit", "Come as You Are", "Lithium", entre outros. O álbum trazia um som agressivo e aproximável o suficiente pra cativar o público em geral, além de contar com baladas como a controversa "Polly" e "Something in the Way". 

Era uma receita de sucesso. A banda ajudou a consagrar o Grunge. Num período de 2 anos, existiu não apenas este, mas outros marcos no gênero, como Dirt, Badmotorfinger e Ten. O Nirvana poderia ter escolhido repetir a fórmula e continuar vendendo mais e mais. Mas não. Na verdade, é falado que seu líder, Kurt Cobain, estava frustrado com o som tão polido apresentado no Nevermind. E a promessa é de que o próximo álbum contaria com os dois extremos da banda, contando com o lado mais cru e também um pouco do pop, fazendo que não fosse apenas o som que os consagrou. 

Um dos responsáveis por essa volta ao som mais cru foi o produtor Steve Albini, grande nome do underground responsável pela produção de álbuns de bandas como Pixies, Jesus Lizard, entre outras. 

Então, em 21 de setembro, nós temos o nascimento do terceiro álbum da banda, In Utero. E, infelizmente, parece que temos ao menos duas versões desse álbum. Por um lado, marca o álbum que segue o Nevermind, a tentativa de retorno as raízes, a briga entre mainstream e underground, a batalha entre limites corporativos e a forma livre de expressão cultural. Algumas críticas disseram na época que era um uso da fórmula conhecida do Nirvana de começar a música de um jeito calmo, até escalar pra um refrão onde iria explodir, só que dessa vez, com um lado mais puxado pela ambientação e pureza que Steve Albini trouxe. E por mais que isso possa ser real em algumas músicas, como Heart Shaped Box e Pennyroyal Tea, é um jeito tão básico de olhar pra esse álbum. 

A cozinha da banda continua encaixando perfeitamente, sabendo como usar de cada momento das composições. Musicalmente falando, soa quase como uma celebração do rock underground, passando por coisas como punk, hard rock, blues e até coisas como post punk e noise rock, com uso de tantas texturas em diversas passagens. Em Dumb e All Apologies é possível se ouvir as cordas ao fundo. Em Frances Farmer Will Have Her Revenge In Seattle, toda distorção e "sujeira" dos companheiros de gravadora, Sonic Youth, podia ser encontrada. "In Utero" poderia ser aplicado sobre esse lado musical. De como, em relação a musicalidade, a banda nasceu. A repercussão na época não foi tão boa, já que não era esse álbum que se esperava como sequência de um álbum tão aclamado comercialmente quanto o Nevermind.

Por outro lado, a outra versão do álbum acontece quando você analisa a parte lírica. E, infelizmente, hoje é muito difícil olhar pra esse álbum de outra maneira. É um testamento a habilidade musical da banda quando as letras desse álbum ficam em segundo plano, quando elas parecem um grito por socorro em diversos momentos, além de trazer outro significado pro título do álbum, sendo "In Utero" também uma observação da infância até essa fase de imagem de uma nova geração que ocorreu com Kurt Cobain. 

Graças ao acontecimento do dia 8 de abril de 1994, Serve The Servants, que antes poderia ser uma crítica aos críticos e até mesmo Kurt fazendo uma análise do som da banda, hoje soa como um desabafo frio. Ou Scentless Apprentice, que foi uma música inspira pelo livro "Perfume", de Patrick Süskind, hoje é observada de perto para ser capturados pontos onde Cobain estaria falando dele mesmo. O refrão de Frances Farmer ("I miss the confort in being sad") poderia ser apenas um "eu não precisava ficar me justificando pra tanta gente", e hoje só soa assustador e cru. O que segue pra Dumb, que dá a entender que Cobain só estaria feliz num estado longe da realidade, graças ao uso de álcool ou drogas, que trazia a ilusão de felicidade, quando na verdade ele só estava se enganando temporariamente.  

Outra demonstração de quão bom compositor era o frontman está em Milk It. Não era só a habilidade de conseguir levar o que estava dentro dele pra fora, mas a forma poética, sarcástica e pura de conseguir trazer mais significados para linhas simples. Mas, mais uma vez, é difícil ler hoje em dia sem pensar no quão devastador isso estava sendo. All Apologies é outro momento onde parece que Kurt Cobain está sendo sarcástico no seu pedido de desculpas, e, olhando após o fato, aparenta ele apenas estar farto de ter que estar ali e se comportar como a mídia queria que a banda fizesse. Pennyroyal Tea da a impressão de que ele já se sentia drenado por todos, e ele se descrever como "Anemic Royalty" durante a música traz um ar de que, apesar dessa sensação de problemas psicológicos, familiares, essas eram grandes razões pro sucesso. Sucesso o qual era sabido que o próprio não queria, e por lidar com todos esses problemas, as linhas "Sit and drink Pennyroyal Tea/Distill the life that's inside of me" são doloridas. 

Foi falado que esse álbum marcaria o fim da trajetória do Nirvana como a banda marca registrada do grunge. Nisso eles falaram. É um registro que fica pra sempre. É estranho pensar num álbum tão depressivo, cru, real quanto este, que, ao mesmo tempo, seja tão divertido, tão grudento e tão gigante. É estranho também pensar o quão interno na mente de Kurt Cobain nós pudemos ver. Muitos dizem que arte é a habilidade de conseguir expressar seus sentimentos. Isso é uma das pinturas mais tristes que eu já vi. Eu não consigo parar de olhar.


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